sábado, 3 de julho de 2010

Semântica

Quatro anos de casamento. Casal na cama. Preliminares sexuais rotineiras. Ela sussurra em seu ouvido, enquanto ele se concentra nos chupões no pescoço:

-Benzinho... Vamos tentar algo diferente hoje?

-Assistir o Animal Planet?

-Não... No sexo! Quero algo mais apimentado. Algo mais... Quente!

Ele pensou um pouco, confuso, enquanto ela mordiscava os lábios de forma insinuante e guiava suas mãos por seu corpo. Cogitou a hipótese de desligar o ar condicionado, mas logo abandonou a teoria.

-Alguma sugestão?

Ela sorriu.

-Eu estava pensando...

-Sim?

-Queria ouvir algo sacana. Uma sacanagenzinha bem gostosa. Que tal, hein?

Em silêncio, ele tentou imaginar o que passava pela cabeça da esposa. Já fazia tempo que o sexo entre eles não era sinônimo de criatividade, mas aquilo estava longe de ser um defeito para ele. Sempre foi horrível com improvisações. Odiava quando ela inventava essas histórias. Era um fã da rotina e se orgulhava disso. Gostava das coisas simples, à moda antiga. Dormiria de ceroulas se não estivesse tão fora de moda.

Ainda assim, resolveu atender à esposa.

-Sacanagem, é?

-Isso, meu gostosão. Quero que você fale muita sacanagem, bem baixinho, aqui no meu ouvido. Vou ficar completamente louca!

-Ok... Vamos tentar. – Disse ele pouco antes de “atacar” aos beijos sua mulher, visivelmente excitada com o novo exercício de criatividade.

-Fala meu gostoso... Fala...

-Tua mãe é uma pilantra... Ah, é! Piranha, piranha, piranha! Velha encrenqueira... Chata! – Emendou ele, já empolgado com a novidade, enquanto mordiscava a nuca da esposa.

-Como é que é?

-Aquela bruxa velha... Safada! – Continuou o rapaz, sem se dar conta da surpresa de sua mulher.

Demorou um bocado para que os dois voltassem a se falar depois do episódio. Ela estava escandalizada com as ofensas brutais desferidas pelo marido, e ele inconformado com a postura da esposa, alegando em sua defesa que “foi ela quem tinha começado”.

No fim das contas fizeram as pazes, mas juraram nunca mais inventarem novidades na cama. Pelo menos não antes de um detalhado planejamento técnico, que envolvia um debate sobre o que seria permitido ou não, e de uma apresentação em Power Point pra deixar tudo o mais esclarecido possível.

Pois é... Até sacanagem tem limite.