quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Conspiração

A noite era silenciosa, e seu caminhar era calculado. Ninguém por perto. A luz fraca do poste mal conseguia projetar sua sombra na calçada. Ainda assim, ao longe, conseguiu distinguir um vulto no banco. Era seu contato, lhe esperando como o combinado.

Sentou apressado e não fez cerimônia:

-E aí? Como é que é? Quando a coisa vai começar?

-Calma.

Tinha uma voz grave, mas segura. Um rosto marcado, e uma expressão amorfa como o de quem já tinha visto, literalmente, tudo e se surpreendido com pouca coisa. Não era a toa que se chamava Universo.

-Como, “calma”? A gente tinha feito um acordo, lembra? –Bradou o rapaz, exaltado.

Mas o Universo manteve-se impávido. Com o mesmo tom de voz seguro, advertiu:

-Seja discreto. Quer que a cidade inteira desconfie do nosso encontro?

O rapaz respirou fundo, e fechou os olhos tentando se convencer de que não valia a pena ficar enfurecido. Acalmou-se.

-Ok. Mas e aí? Como fica nosso acordo?

-Fica como o combinado. Vai sair.

-Mas eu não tenho visto resultados... E já faz tempo que a gente conversou.

O Universo sorriu, irônico, sem sequer se dar ao trabalho de observar o rosto aflito do rapaz.

-E você acha mesmo que isso acontece do dia pra noite? Acha?

-Eu sei que não, mas...

-Você não tem ideia do tamanho disso, cara. Sequer passa pela sua cabeça o grau de complexidade envolvido nesta operação.

O rapaz se conteve depois do súbito tom repreensivo adotado pelo Universo. Não imaginava que teria que esperar tanto. Sempre tinha sido apressado por natureza, impulsivo. Talvez por isso mesmo tenha tido a ideia de propor uma conspiração, visando lhe favorecer. Era irônico agora ter que esperar. Mas, ao mesmo tempo, compreendia a situação. O Universo era um cara ocupado com zilhões de coisas pra fazer, tarefas infinitas. Sua agenda evidentemente devia ser apertada. Isso sem contar que era algo “feito por debaixo dos panos”, o que exigia certo grau de discrição. Mas ainda assim não conseguia evitar a ânsia crescente pelo seu sucesso.

-Ok. Talvez eu esteja sendo apressado. Mas é que faz tanto tempo que você prometeu me ajudar...

O Universo achou graça do “faz tanto tempo”. Alguém vindo reclamar sobre o tempo justo com ele... Haja ironia. Pensou em rir, ou em fazer um comentário sarcástico do tipo “o Einstein disse que isso é relativo”, mas julgou que era meio inútil. Ia soar como provocação. Naquela altura já estava quase arrependido de ter aceitado o esquema proposto. Odiava impacientes. Ainda assim, resolveu usar um tom mais paternal:

-Eu vou te ajudar, calma. Mas isso não acontece do dia pra noite. Tenho falado com meus contatos, analisado meios de fazer acontecer... Vai dar certo, relaxa.

O rapaz pensou em pedir prazo, em apresentar contrapropostas, mas se sentiu satisfeito. Concluiu que ele de fato estava empenhado no acordo. Além do mais era uma operação difícil, por mais que sua pressa o fizesse ignorar isso na maior parte das vezes. Sendo assim, deu-se por satisfeito, momentaneamente.

-Tá. Ok. Confio em você.

-Já era hora.

-Mas e aí? Como é que a gente faz se precisarmos nos ver de novo?

-Eu te encontro, quanto a isso não se preocupe. Fontes não me faltam.

-Ok.

-Agora, se me der licença, vou indo. Espere aqui no banco alguns minutos e saia. Certifique-se que não tem ninguém te seguindo, como te ensinei.

-Tudo bem. E, ei... Obrigado de novo, viu?

O Universo fez um leve aceno com a cabeça ainda sem olhar para a face do rapaz. Se levantou, ergueu a gola do sobretudo negro, e caminhou na direção Oeste sem pressa, se tornando aos poucos apenas um vulto em meio as luzes escassas dos postes.

No banco, esperando para sair sem levantar suspeitas, o rapaz suspirou:

-E eu que achava que esta história do universo conspirar a meu favor seria mais fácil...